2 de outubro de 2011

O vaso de Violeta

Um real e quarenta centavos, disse-me a caixa do supermercado. Diante da indecisão, entre um miojo de tomate que garantiria minha janta, e a exuberância do roxo e branco do vaso, optei pela flor e pelo estômago vazio.

Chegando na república estudantil, meus colegas de moradia me olharam estranho e me indagaram sobre a tal flor. Expliquei que a achei linda, como um sorriso que via todas as terças-feiras. E que aquele vaso seria uma demonstração do meu afeto.

Riram-se de mim. "És um romântico", me dissera outro. No olhar atento de um outro grande amigo, senti em si que havia compreendido-me o gesto e se dispôs a acompanhar-me na empreitada.

Fazia um frio tremendo naquela madrugada, mas para que o plano desse certo, teria que praticá-lo na calada da noite. Junto ao vaso, seguia um pequeno bilhete bem dobrado que assim dizia:

"Nome ela não tem, mas você pode dar um a ela. Regue uma vez por semana e deixe-a perto da janela, para que o sol possa tocar-lhe as pétalas. Ela sabe um grande segredo meu, converse com ela, que ela te dirá".

Diante da porta da velha casa, que não tinha portão, dava-se para ver a luminosidade da tv, pelo vidro temperado da porta. Isso deixava a ação mais difícil, mas não menos emocionante. Meu amigo me apoiava nas empreitadas, acho que ele se divertia com essas peripécias românticas, ou simplesmente pagou para ver se eu mesmo estava doido em fazer aquilo.

Subi os três degraus e cheguei à porta. Depositei delicadamente o vaso, afim de evitar qualquer ruído. Sentia-me com o coração a grandes batimentos, afinal, era uma declaração de amor. Ainda titubeei na arrumação, quando senti que alguém do interior da casa havia se levantado. Pensei que estava tudo a perder, mas a sombra havia apenas se levantado para desligar a tv.

Missão cumprida, nos mandamos dalí. Fiquei ãlguns dias ansioso, até que chegasse a terça-feira.

Violeta adentrou na sala, linda e cheirosa e me mirou com um lindo sorriso.

"Adorei o presente". Isso era um bom sinal, afinal eu não havia assinado o bilhete, mas ela sabia que era eu.

"ela é linda" soltou as sílabas pelo lindo lábio.

Mas como todo amor platônico, sinto informar ao leitor que não se concretizou.

O que se sucedeu depois de tamanha emoção foi que, me dirigi a um ponto extremamente estratégico, onde o sol incidia sua luz de fim de tarde mais bela, e lá a esperei. Ela apareceu com os cabelos envoltos ao vento e ao me ver, veio em minha direção. Diante de um pouco mais de diálogo, vacilei, e deixei o amor de Violeta partir, para além das estantes frias da biblioteca.


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