3 de novembro de 2010

I Feel Good!

"O primeiro dever do amor é escutar." -Paul Tillich

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Do ônibus pela manhã ainda vacilava sobre a decisão que tinha tomado.

Em 40 minutos girei pela última vez a maçaneta. O ambiente era sóbrio como sempre, com aquele ar de paz costumeira. Não abri a veneziana como de costume para ver o Sol entrar, queria estar bem imerso nas minhas conversações, com a máxima dedicação, como se fosse no primeiro dia, há sete anos atrás.

O Telefone trilintou e a voz que escutei já era esperada. Me ligava sempre, era a primeira de todas. Conversamos alguns minutos e fiquei feliz em saber que está superando suas dores e está esperançosa pelo futuro. Leu-me um texto muito bonito. Sua despedida foi "que Deus te ilumine". Ela não sabia que era nossa última ligação. Por mais desapego que nossa função exige, sinto que sentirei sua falta.

A segunda ligação me recordou um episódio já postado neste blog. A última vez que conversamos já tinha mais de meses e eu havia estranhado seu sumiço. Na ocasião, o céu estava azul, ensolarado. O céu de hoje constratava entre um nublado e um sol tímido. Conversamos por cerca de duas horas. Foi uma conversa descontraída. Não havia problemas dessa vez, somente sua solidão. Talvez eu tivesse um receio de ir embora sem conversar com ela pela última vez. A intensidade da conversa me deixava tonto e pensativo, sempre. Me causava diversas reflexões. Foi sem dúvida, uma das pessoas que mais mexeu com todo o meu ser humano, tamanha a complexidade de sua alma.

A última ligação foi rápida. Parecia-me chegar a um desfecho já imaginado. Esta me despedi. Informei que a próxima ligação, uma outra voz ela escutaria, mas com a mesma atenção e disposição.

Pronto. Tinha acabado minha missão alí. Assinei o caderno, coloquei o casaco, entreguei chaves e crachá, abri e fechei a porta. Sabia que alí estava me reformulando, como se tivesse levado a armadura para polir, já gasta pela batalha, e deixá-la nova e brilhante. Eu adoraria continuar. Mas, como uma locomotiva, somos obrigados a trocar a lenha, para andar.

Não descarto uma volta, pois sei que em dias a saudade vai bater. Algumas pessoas já nascem prontas para certas funções, acho que faço parte desse grupo. Desvencilhar-se do que gostamos é tarefa árdua. Mas a necessidade de sair da caixa de Pandora me motivou a tomar a decisão.

O que me alegra é que a cadeira 53 sempre estará lá, pra me assumir, quando eu sentir sua falta. I feel Good!


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